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LÉON HARMEL


Léon Harmel, nascido em 1829, foi um industrial francês profundamente empenhado na aplicação da “Doutrina Social da Igreja” na sua fábrica de Val-des-Bois. Camarlengo secreto de Leão XIII, fez a experiência da doutrina social da Igreja, iniciando-a na sua tecelagem de Val-des-Bois, em Warmeriville, perto de Reims.

Tendo herdado do pai a fábrica textil de Val-des-Bois, Harmel, inspirado por uma espiritualidade evangélica e franciscana, pois tinha sido membro da Ordem Terceira de São Francisco de Assis em 1861, toma a decisão de fazer da sua fábrica uma espécie de comunidade cristã, onde os trabalhadores dirigiam, eles mesmos, um conjunto de obras sociais: escola, economia doméstica… Promove, em 1883, a participação dos trabalhadores na direção e conservação da disciplina da empresa com delegados de secção; depois, uma caixa de família, gerida por uma comissão de trabalhadores, encarregada de atribuir subvenções em dinheiro ou em géneros. O seu lema era: “o bem do trabalhador com o trabalhador, nunca sem ele e, mais ainda, nunca à margem dele”. 

No Congresso de Lyon, em agosto de 1874, Harmel faz uma série de conferências que impressionam os 850 participantes, entre os quais se encontrava o Padre Dehon. As suas palestras receberão as mais cordiais felicitações de Pio IX. 

Na noite de 13 de setembro de 1874, um incêndio reduzia a um montão de escombros a grande fábrica de Val-des-Bois. Três horas foram suficientes para destruir o que havia custado tanto dinheiro e tantos anos de sacrifícios. Na segunda-feira seguinte, 14 de setembro, festa da Exaltação da Santa Cruz, às 7 da manhã, toda a família Harmel abeirava-se da Comunhão, seguida de mais de 200 pobres operários, que tinham vindo pedir ao Coração de Jesus força e coragem.

A fé testemunhada por Léon Harmel nesse desastre foi digna de um santo e o espírito de iniciativa digno de um grande empresário. Mais que consigo mesmo, preocupou-se com os seus operários, a fim de lhes dar trabalho, segurança e serenidade nos meses que se seguiram, antes de reconstruir a fábrica. Para isso, alugou uma fábrica em Neuville, levando durante a semana grande parte dos trabalhadores para o trabalho e trazendo-os de volta a Val-des-Bois, para passarem o domingo com a família. As subscrições em toda a França ajudaram a reconstruir a fábrica de Val-des-Bois.

Marcada mais por uma espécie de “familiarismo” do que por um “paternalismo”, embora o tratassem por “le bon père”, a ação de Léon Harmel inspira-se no catolicismo social, em particular na Obra dos Círculos de La Tour du Pin e de Albert de Mun. Harmel cria, em Reims, os círculos cristãos de estudos sociais, nomeadamente com os membros da arquiconfraria de Notre-Dame de l’Usine. Ao mesmo tempo, estabelece, em 1891, a Sociedade Industrial dos Patrões Cristãos. Condenando o liberalismo económico, que deixava o trabalhador sem proteção perante o capital, Harmel e os membros dos Círculos queriam, em primeiro lugar, garantir a segurança moral e material dos trabalhadores, no âmbito das “corporações” cristãs, das sociedades religiosas e económicas, formadas livremente por patrões e trabalhadores.

Em 1887, acompanhou a Roma uma “peregrinação da França operária”, reunindo mais de 1.400 trabalhadores. Em 1890, Leão XIII acolherá 10.000. No ano seguinte, este publicará a Rerum Novarum, onde aborda a condição dos trabalhadores e a justiça social. 

Pouco apreciado pelo patronato cristão, Harmel distancia-se deste aos poucos. Insistindo sobre a validade da ação política, e não já só sobre o social, Harmel, apoiando-se na encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII, instiga os católicos a aderirem à República e encabeça o movimento da democracia cristã. 

Sob o impulso do Padre Dehon, em 1888, fazem-se em Val-des-Bois sessões de estudo, que reúnem, numa primeira fase, alguns seminaristas da região e da cidade de Paris, bem como democratas cristãos do norte de França. 

Da saudade da cidade cristã, que se manifesta no seu Manuel d’une corporation chrétienne, publicado em 1879, à ação dos católicos na esfera política, o itinerário de Léon Harmel é significativo numa leitura da viragem do século em França. 

Léon Harmel morreu a 15 de de Novembro de 1915, em Nice.

Os Dehonianos da Província Francesa foram capelães da fábrica Harmel até 1957, quando a capelania foi abolida.

A família Harmel foi proprietária e administradora desta fábrica até a empresa ter entrado em falência em 1977. A cooperativa Warnex continuou a laboração até 1984.

No início da década de 2000, foi criado o Instituto Político Léon Harmel (IPLH), um estabelecimento de ensino superior privado dependente da reitoria de Paris. Oferece mestrados em Ciência Política para quem deseja trabalhar em organizações, mestrados em bioética e cursos de formação disponíveis sob o modo presencial e de ensino à distância pela internet.

Da fábrica de Léon Harmel restam apenas alguns vestígios. Na área da antiga fábrica foi criado o Parque Comunal Harmel, inaugurado a 5 outubro de 2017.  É neste Parque que se encontra a Sala do Círculo (em homenagem aos Círculos Católicas nos quais tanto se empenharam o Padre Dehon e Léon Harmel). Trata-se de um espaço polivalente para usufruto da população de Warmeville (Val-des-Bois).

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DEHON E O COMPROMISSO SOCIAL


Ainda jovem sacerdote coadjutor em Saint-Quentin, Leão Dehon deixou-se tocar pelo problema da degradação social e, inspirado pelo espírito de amor e de reparação, interessou-se profundamente pela chamada questão social. Aprendizes, operários, estudantes, empresários mereceram a sua atenção.

Procurou desde então uma solução para os graves problemas suscitados pela revolução industrial. Esforçou-se por despertar a consciência dos sacerdotes e também dos seminaristas para os problemas sociais, para que saíssem das sacristias e fossem ao povo.

Não obstante todo o seu empenhamento e a quantidade de livros e de artigos que escreveu sobre temas sociais, o Padre Dehon não é, no entanto, um sociólogo, mas antes um apóstolo da acção social, um precursor, um animador, um formador de consciências.

A 6 de Setembro de 1888 encontra-se em Roma, para agradecer a Leão XIII o «Decreto de Louvor» e o Papa, que bem o conhecia e estimava, convida-o a fazer-se apóstolo das suas encíclicas: «Pregue as minhas encíclicas». Esta será a missão e o compromisso que caracterizam o seu apostolado até à morte do grande Papa.

A 25 de Janeiro do ano seguinte lança a revista «O Reino do Coração de Jesus nas almas e na sociedade». É o ano centenário da Revolução Francesa. Recorda as propostas dos Estados Gerais de 1789: restauração das liberdades populares, reforma da justiça, contenção nas despesas, mais equitativa repartição dos impostos, reorganização das ordens religiosas. Eram propostas de sábios revolucionários ou melhor prudentes reformadores, sistematicamente ignoradas pela Revolução e pelos seus herdeiros.

O lema social do Padre Dehon será «Ide ao povo!», para torná-lo cada vez mais consciente dos seus direitos e dos seus deveres.

Para realizá-lo, suscita colaboradores leigos, mobiliza os sacerdotes e sensibiliza as classes dirigentes para os deveres cristãos do empresário e dador de trabalho.

Desperta nos operários a necessidade de serem apóstolos entre os seus companheiros de trabalho. Considera que o estado deve intervir com uma oportuna legislação social. Defende primeiro os sindicatos mistos e depois os sindicatos operários: pretende que os trabalhadores sejam protagonistas das suas legítimas reivindicações e na conquista e defesa dos seus direitos.

Por ocasião da morte do Papa dos operários e da questão social, escreve inconscientemente também o seu testamento social:

“Leão XIII conservou até ao fim uma confiança inabalável… este século será democrático. Os povos querem uma grande liberdade civil, política e comunal. Os trabalhadores exigem uma parte razoável das sua fadigas. Mas esta democracia ou será cristã ou não será democracia… Qualquer tentativa de reforma social fora do cristianismo mergulhará no egoísmo ou no domínio da força. As nações oscilarão entre a tirania de um só ou a de uma oligarquia. Não há reforma social prática, cujo gérmen não esteja contido no Evangelho. O século XX fará tentativas desastrosas, e voltará ao Evangelho para não perecer na anarquia” (RCJ 1903, 375-6)

A 20 de Novembro de 1893 tinha feito um dos sacrifícios mais dolorosos da sua vida, renunciando definitivamente à direcção do Colégio S. João. Tornava-se mais livre para dedicar-se à Congregação e ao apostolado social.

Já anteriormente recebera o encargo de presidir à Comissão de Estudos Sociais da diocese de Soissons. A primeira tarefa que a comissão quis assumir apontava no sentido de reunir num manual os princípios seguros da doutrina social católica e as suas soluções práticas. Nasceu assim o «Manual Social Cristão».

O «Manual», adoptado como compêndio de estudo em Seminários e Faculdades, em França e no estrangeiro, contribuiu decididamente para tornar conhecido o pensamento e a actividade sócio-política de Leão XIII, com uma consequência deveras histórica: o rejuvenescimento da Igreja de França, lançando o clero e especialmente os jovens sacerdotes no apostolado social.

A necessidade de mudanças radicais nas estruturas da sociedade não era pro-pugnada só por pensadores do género de Karl Marx e Saint-Simon. Católicos lúcidos e dinâmicos reconheciam o imperativo de uma verdadeira obra de justiça social e lutavam por ela. Homens como Renato La Tour du Pin, Albert de Mun e Léon Harmel, apesar de muitos condicionalismos de vária ordem, empenhavam-se de forma corajosa e eficaz. O Padre Dehon relaciona-se com eles e apoia a sua acção.

Ao lado de La Tour du Pin, o teórico da acção social cristã, de A. de Mun, o organizador, deve ser especialmente recordado Léon Harmel, apóstolo, homem de acção e abnegado realizador no campo concreto das suas empresas de Val-des-Bois. Trata-se de um homem cheio de vigor, simples, directo e, por vezes, inflamado, corajoso nas suas iniciativas, sem complexos, sem rodeios e sem temores inúteis. Seu grande amigo e conselheiro era o Padre Dehon, a quem submetia os pontos doutrinais dos seus discursos e de quem aceitava os conselhos para uma acção social cada vez mais enérgica e perseverante.

Os conselhos do Padre Dehon tinham a marca da sabedoria, da competência, da audácia moderada e da caridade. Procurava a objectividade e defendia com serenidade o que considerava ser justo e verdadeiro.

Assim como era amigo de sociólogos e empresários, assim também era grande amigo dos operários. Sabemos por uma testemunha ocular que, em Saint-Quentin, sempre que se falava do Padre Dehon, falava-se como de um amigo.

Encontrava-se à vontade com os empresários cristãos, mas era também o Padre dos operários e defendia de forma justa os seus direitos: 

“O primeiro dever do patrão consiste em garantir ao operário e à sua família o necessário para viver condignamente, antes de pensar em melhorar a sua situação com iniciativas de caridade” (AD, B 48/2d, doc. 6).

Dizia o Rev. Bruyelle, decano de Sissonne (Aisne): 

“São necessários santos, para resolver a questão social. Sem santidade o homem é lobo para o homem” (AD, B 48/2d, doc. 30).

Léon Harmel tinha esse estofo. Homem de grande fé, vivia o abandono ingénuo, absoluto em Deus: um autêntico místico.

Da amizade de Harmel com o Padre Dehon nasceu a colaboração na animação espiritual da grande fábrica de Val-des-Bois. Desde 1887, o Padre Dehon assegurara a assistência religiosa àquela comunidade operária. Enviou o seu assistente geral, o Carlos (Barnabé) Charcosset e dois outros religiosos. O Pe. Charcosset foi, até à sua morte, um verdadeiro pai espiritual para os operários e suas famílias. Morreu em Nice, a 29 de dezembro de 1912, depois de ter desempenhado vários cargos de responsabilidade na Congregação.

Harmel era um exemplo concreto de como se realiza o reino do Coração de Jesus entre os operários. Em setembro de 1887, o Padre Dehon escreve: 

“Val-des-Bois, oásis no deserto da nossa pobre França. A paz social reina nesse mundo operário. Encontro ali um verdadeiro espírito de fé e de caridade, o amor ao sacrifício, o cuidado dos pobres e dos doentes. É para nós uma graça estar imersos nessa corrente de vida de imolação e de caridade” (NHV XV, 68-69).

Léon Harmel fundou a «Associação Íntima» das vítimas voluntárias pela conversão do mundo operário. O seu apostolado preferido era os doentes. Um dia, na Câmara dos deputados, alguém quis saber ironicamente quanto custavam as comunhões aos patrões de Val-des-Bois. A resposta de Léon Harmel não se fez esperar: «Custam os sofrimentos das nossas vítimas voluntárias. Semeai Cristo e recolhereis heroísmo.»

Se pensamos no abandono e na miséria em que vivia o proletariado do tempo, explorado pelo egoísmo dos patrões, não podemos deixar de admirar a inteligência empresarial de um homem que faz dos operários participantes na responsabilidade e na gestão da empresa, que é dele e deles, antecipando os tempos ao menos meio século. 

“Tenho duas famílias – dizia: a que a Providência me deu e a que a consciência me impôs: os meus operários” (A. Dansette, Histoire religieuse, 497).

Um amor levado até ao heroísmo, juntamente com uma grande inteligência, explicam o sucesso do «Bon Père», como era habitualmente chamado. O Padre Dehon era o «Très Bon Père».

Leão Dehon tinha diante dos seus olhos este belo exemplo de Léon Harmel, que, em Val-des-Bois, criara uma espécie de comunidade operária cristã com numerosas obras, geridas pelos próprios trabalhadores, destinadas a tirá-los do isolamento e da pobreza e a conferir-lhes uma dignidade pessoal.

Este modelo de organização da fábrica de Val-des-Bois entusiasmava o Padre Dehon a prosseguir no seu apostolado social. Dehon intervém nas reuniões do jovem clero, nas quais se afirma como figura excepcional e incontestada pelo equilíbrio do seu pensa-mento, pela coragem ponderada, pela inteligente fidelidade às directrizes pontifícias, pela segurança da doutrina sempre exposta com clareza e serenidade.

A 10 de Dezembro de 1896 parte para Roma. Deseja inteirar-se das várias intenções do Papa em matéria de doutrina social. Durante a estadia de quatro meses proferirá as chamadas «Conferências Romanas» sobre a questão social, perante um auditório atento e interessado. Entre os 500 participantes encontrar-se-ão alguns cardeais. Não faltarão aplausos e lisonjeiras referências nos jornais.

Os conselhos do Padre Dehon tinham a marca da sabedoria, da competência, da audácia moderada e da caridade. Procurava a objectividade e defendia com serenidade o que considerava ser justo e verdadeiro. 

Circunstâncias várias levam-no a abrandar a actividade social. Mas continua atento e interessado. Em 1908 publica a última obra sobre matérias político-sociais. Está com 65 anos. Por essa altura, o desenvolvimento da Congregação absorve-o quase por completo. Realiza também algumas viagens, sobretudo como Superior Geral, de visita aos seus filhos. Durante cerca de quatro meses, visita a América Latina.

Em 1907 vai à Finlândia e à Rússia. De Agosto de 1910 a Março de 1911 dá a volta ao mundo, atento aos problemas dos vários povos, de modo especial no tocante à evangelização.

Entrando no 70º ano de existência, a 14 de Março de 1912, escreve aos seus religiosos uma longa carta, mais conhecida pela designação de Lembranças («Souvenirs») em que faz como que um balanço da sua vida. E é nestes termos que se refere ao apostolado social: 

“Quis contribuir para a elevação das massas populares, com o advento da justiça e da caridade cristã” (Cartas Circulares, n. 388).

E recorda as publicações, as conferências, os numerosos congressos, as longas viagens de documentação e actualização. Considera que cumpriu uma missão. Nada pede em especial aos eus filhos, mas não deixa de lhes recordar que também neste sector o trabalho leve continuar, porque 

“as massas não estão ainda convencidas de que só a igreja possui as soluções verdadeiras e práticas de todos os problemas sociais” (Cartas Circulares, n. 388; cf. n. 389).

Não há nada a procurar no Evangelho senão o amor de Jesus, desde a sua Encarnação até à morte.
Padre Leão Dehon
O Coração de Jesus é o sol que nos ilumina pelo seu Evangelho, que deu aos homens como um feixe de verdades, de luzes, de ensinamentos e de exemplos.
Padre Leão Dehon
Nosso Senhor está na Eucaristia para amar e se deixar amar.
Padre Leão Dehon
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